
Obs.: Notem que, em certo palavrão, houve a troca da letra "o" pelo "0", pois o filtro do fórum trocaria a palavra completamente.
Lá vai:
Sobre Putas, B0cetas e Caralhos
A semântica do palavrão é uma questão muito mais "cultural-pseudo-moralista" do que, propriamente, lingüística. Palavras que, no passado, eram um tanto quanto ofensivas, hoje, podem não ser (e vice-versa, claro).
Por exemplo: numa discussão, caso chamemos alguém de histrião, é provável que o ser a quem direcionamos nossa "ofensa" não faça a mínima idéia do que está sendo chamado. Entretanto, trata-se da raiz {histr}, que significa "bobo", "palhaço". É uma palavra ofensiva? Não, pois praticamente NINGUÉM sabe de sua existência. Foi ofensiva um dia? Quem sabe...
Da mesma forma, adianta chamar alguém de tolo? Creio que não haveria muita força na ofensa, e causaríamos até riso na pessoa a ser ofendida. Ou seja, uma palavra só é ofensiva, se tal conceito, a ela, for atribuído por determinada sociedade. Por exemplo: no latim, o verbo putare veio a ser o que chamamos de computar. O sufixo {com}, significando "junto", apareceu mais tarde. Portanto, quando um romano falava "ele computa", dizia apenas puta. Hoje, a palavra puta tem outro significado, mas nada a ver com o putare latino e suas variações. A raiz de sua origem é {putr} (também latina), mas significa "decomposto" (originou podre, pútrido) como "depravada" (originando puta).
Com caralho, acontece a mesma coisa. Pelo dicionário Michaelis, temos:
caralho - sm (lat *caraculu, pequena estaca)
É a raiz {cara}, a que foi adicionado o sufixo {culu}, indicando diminuição (o mesmo que ocorre em vermiculu - vermezinho, que deu origem ao nosso "vermelho"). Uma rápida pesquisa num dicionário de latim, e achamos as seguintes variações:
- Cara: uma planta e sua raiz, que, misturada com leite, mitiga a fome.
- Chara: espécie de couve.
- Characatus: cepa empada com canas grossas.
- Characias: erva; espécie de cana grossa.
Tantas evidências mostram que as raízes {car} e {char} têm uma ligação clara com plantas, caules e ervas. Ora, tratando-se do genital masculino, era óbvio que se fizesse uma ligação, tanto pela forma, como pela função (até semente sai dele!), surgindo o caralho.
Todavia, não sejamos machistas! Contemplemos a b0ceta. Eça de Queirós já escrevera em seu "Primo Basílio":
"Mas então era pior que estar numa sala; era abafar numa b0ceta! Mas não! Iam a uma quinta."
Que absurdo escrever "b0ceta" num romance, não? NÃO! Essa palavra significa caixa pequena e tem a mesma raiz do inglês box e do francês boîte. Portanto, "abafar numa b0ceta" era ficar preso num lugar quente, fechado e pequeno. Por algum motivo (óbvio?) é que a palavra foi ligada ao genital feminino...
== Sobre o olho cego ==
Se, numa discussão, alguém fosse pego gritando: "Vá tomar no procto!", é provável que os interlocutores tivessem pena do irritado em questão, pois "nem xingar ele sabe!" - pensariam. Mas, não! Ele apenas usou a raiz grega {proct}, que significa ânus, em vez da latina {cul}, que significa nádegas e foi adotada vastamente pelo mundo das línguas Neolatinas (Port. cu; Esp. culo; Ital. culo). Aliás, culatra e recuar vieram dessa mesma raiz, além de outras palavras consideradas "normais".
Com mais pesquisa, seria possível colocar mais uma meia-dúzia de exemplos aqui. Pode-se perceber que os motivos conceituais que tornaram as palavras b0ceta, caralho e puta palavrões (por enquanto) são os mesmos que tornaram as palavras deus, sacramento e santo bem quistas: sociedade + cultura + (pseudo)moralismo.
- Darini
Bibliografia:
- Dicionário online Michaelis Escolar;
- CRETELLA Jr, Fernando; CINTRA, Geraldo de Ulhôa. Dicionário Latino-Português. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1950;
- FERNANDES JR. A. Dialética da Língua Portuguesa. 1ª ed. São Paulo: LivroPronto, 2007.
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