Algumas semanas atrás, enquanto lia as notícias, um site que eu adoro chamou a atenção para uma edição caprichada das obras completas de Sherlock Holmes, escrita pelo figuraço Arthur Conan Doyle, que estava de graça na Amazon. As aventuras do clássico detetive estão em domínio público já faz alguns anos (embora, para variar, haja alguns imbróglios relativos ao copyright de algumas histórias nos EUA...), então você consegue achar diversos ebooks por aí com variados graus de organização, cronologia e completude; este em questão está um espetáculo em relação a esses quesitos. Como eu nunca li as histórias em ordem, bem como pulei diversas aqui e ali e de outras eu quase não me lembro, resolvi aproveitar a chance para (re)ler tudo na ordem correta e no original, revisitador que ando de um monte de coisas que gosto - isso inspira que é uma beleza
Conforme for lendo, vou postando os reviews de cada parte da obra correspondente às publicações separadas.
A Study in Scarlet (Um Estudo em Vermelho)
Capa da antologia na qual a primeira história saiu - só uma dúzia dessas sobreviveu ao tempo.
O primeiro dos quatro livros com histórias completas do personagem; os outros cinco são coletâneas de contos. Como acontece na absoluta maioria das narrativas do detetive, o mesmo é a descrição feita em primeira pessoa do doutor John Watson sobre as peripécias de Holmes, uma tentativa por parte do médico de registrar e dar crédito ao trabalho fantástico de dedução do mesmo - anteriormente relegado aos investigadores da Scotland Yard, que pediam ajuda a Sherlock e ficava com os louros públicos pela solução dos crimes. Além da curiosa maneira como ambos se conhecem e o fascínio imediato que Holmes provoca em Watson, o embrião de todas as demais histórias está aqui: as excentricidades do detetive, o tédio que o acomete quando não está resolvendo crimes, a aquisição dos detalhes, a formulação da teoria, a divulgação de parte da mesma para os envolvidos, a prisão do suspeito e aí a resolução final da coisa, bem como a sempre incrível cadeia de observações que regula e conduz o raciocínio de Sherlock. Quando era pequeno, a primeira das histórias que eu li ("A Casa Vazia", de um dos livros posteriores) e que seguia essa padrão simplesmente me fez pirar e virar fã daquela figura que eu já conhecia de relance dos filmes e referências na mídia -
O Enigma da Pirâmide tem sua cota de culpa nesse processo também.
Este aqui contém algumas passagens memoráveis, como Holmes e Watson discutindo sobre os detetives ficcionais e porque Sherlock não ia com a cara deles - incluindo o Dupin de Edgar Alan Poe, outro culpado por eu gostar de mistérios e que praticamente inventou o gênero. Mesmo o crime sendo interessante e a dedução sobre ele melhor ainda, este aqui - na minha depreciável opinião - tem um defeito grave: a quebra da narrativa que esfria a coisa toda. Você tem a primeira metade do livro, no ritmo bacana de sempre, aí Holmes prende o suspeito (ainda sem você saber por quê, claro) e a mesma termina. Os próximos seis longuíssimos capítulos então contam uma história morosa sobre os mórmons(!) em terceira pessoa que tem a ver com o background do crime em si, só para então voltar para as palavras de Watson, a conclusão do detetive e o fim da história, tudo isso em uns dois capítulos. Fica um tanto chato isso, e o problema é que nem é pelo fato de ser um dos primeiros livros que ele escreveu - infelizmente, ele faz a mesma coisa em uma história futura, algumas décadas depois desta...
Entretanto, é o único e aceitável pecado do livro, principalmente levando em conta o que ele acabaria por gerar para a cultura pop e que já se encontra quase redondinho aqui - e só melhora com o tempo.